Abri o portão:
- Marcos.
- Marcos. - minha irmã repetiu.
Lembro das últimas vezes que vim aqui. Meu pai nervoso. Lourdes pelada pela casa. Colocava músicas na maior altura. E outros desaforos, e meu pai não tinha paciência. Por isso, vim sem Lourdes. Por mais que Lourdes seja uma empresária de sucesso, a sua conduta desvairada era demais para meu pai conservador. As lembranças dela na minha família não são boas. Não conseguiu pontos a seu favor.
Estela parecia aquelas modelos altas. O pai tem mais haver com aspecto físico dela: pele clara, olhos azuis, corpo magro, embora o pai não fosse tão alto.
E eu estava ali pra o velório do meu pai. Ninguém soube de minha mãe. Fazia décadas que não tinhamos notícias dela. Minha mãe, vi poucas vezes ela. Diziam que eu parecia com ela; corpo largo e alto; cabelo preto e liso. Vi o quadro na parede da sala. Cavalos. Meu pai dizia "Lourdes é louca. Precisa de médico."
Eu tinha esperança de Lourdes ser menos exagerada.
A cólera é um cavalo fogoso; se lhe largamos o freio, o seu ardor exagerado em breve a deixa esgotada.
- William Shakespeare
Muita gente estraga a vida com um doentio e exagerado altruísmo.
- Oscar Wilde
O egoísmo de Lourdes, seus modos nada formais, um tanto altruísta; seu aspecto ardente, cheia de paixão transbordante às vezes, e sua impetuosidade. E aqui essa casa, sem meu pai. Agora restou Estela e eu. Fomos para o local do velório.
- O pai estava falando certas coisas.
- Certas coisas? - indaguei.
- Coisas como Deus existe, e que Jesus é o caminho, a verdade e a vida.
Estela estava com o pai a vida toda. Esses assuntos espirituais, apesar de Jesus ser o filho de Deus, que se fez homem, e eu, bem, quem sou eu, como podemos ir para o céu? Essas dúvidas.
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